Luiz Carlos da Vila – a luz de um vencedor

Luis Carlos da Vila na Lira de Ouro

Canja na Lira de Ouro em Caxias em noite inspirada

notícia da morte de Luiz Carlos da Vila nessa segunda-feira nublada parece que não é verdadeira, parece não fazer o menor sentido.

Logo ele, um poeta vivamente marcado na alma do povo, doce refúgio de beleza… Putz, afinal o show tem que continuar, caralho…

Justo aquele cara de tantas madrugas, de tantos versos inclassificáveis do Cacique de Ramos, sujeito que naquele momento onde os rótulos ainda não eram marcas significativas lá pelos anos 80 já dava pistas do que vinha por aí… Aquele neguinho tinha um brilho especial, isso é incontestável.

Poeta do samba era a expressão que começava a se cristalizar a respeito daquele indivíduo que tanto causava espanto e admiração.Além da Razão era um esculacho de poesia na cara de qualquer um que ainda achava aquela movimentação do fundo dos quintais algo rasteiro e passageiro. E depois foi uma pedrada após a outra, de versos rebuscados e ao mesmo tempo tão populares no melhor e mais rico sentido dessa palavra.

Depois que aqueles sambas sacudiram os alicerces da cultura urbana brasileira, a figura de Luiz Carlos se ergueu soberana. Mesmo não sendo o biotipo do “linha de frente” midiático, seu nome e sua poesia marcaram definitivamente todas as noites de quem rodava os subúrbios cariocas em busca de boas rodas de samba. E depois o resto do Brasil.

Era um mestre. Um poeta.

Isso sem falar do Kizomba… Um marco na cultura desse país.
Eu era um adolescente inquieto, cercado de amigos roqueiros, leitor de Marx e do almanaque do Fantasma, um pé na contracultura, o outro na cultura de massa que iria se cristalizar nos anos vindouros e seus playstations; iniciando aquele momento rock-acampamento-primeiras-inebriações, onde a revolução estava na Maldita FM e sua rebeldia urbana completamente sintonizada com uma angústia pós-ditadura, que queira sair de qualquer jeito, acompanhada de revanchismo, transgressão e desejo de votar pra presidente naquele país do Sarney.

Foi quando nos veio aquele carnaval da Vila de 88 e aquele samba irresistível e dilacerador daquele tal Luiz Carlos da Vila, que nem da Vila Isabel era… a Vila dele era o da Vila da Penha, local pertencente ao território sambístico do Irajá e seus mágicos arredores…

Depois, bem depois, voltei a encontrar Luiz Carlos pelas madrugadas da vida. Além das rodas de samba da Lapa, Zona Sul e Zona Norte, o sujeito estava sempre pela nossa Baixada, muitas das vezes aqui em Caxias, com Bira da Vila, Zé Antônio e amigos. Conhecia onde a coruja dorme…

Há a participação especialíssima no disco do grupo Nosso Canto, ainda com o saudoso Jorge Macarrão, cantando Existe um Lugar, de Clayton Vabo (Eu já falei pra vocês que no subúrbio existe um lugar pra se cantar / Lá o samba só finda no alvorecer / E a poesia é a doce razão que nos faz viver).

E teve as noites de Luiz Carlos na nossa Sociedade Musical e Artística Lira de Ouro, onde sua presença, assim com a de Cláudio Camunguelo, abrilhantava a existência de quem viveu esses momentos.

E ainda lembro das terças-feiras no Bar do Beto Cavaco, ali no centro de Caxias, onde a nata da poesia e da malandragem se reunia pra celebrar o ritual de samba e vadiação. Quase sempre os sambas rolavam enternecidamente, magicamente, alegrando a todos e quando se achava que era demais pra um existência só, chegava Luiz Carlos da Vila e seu brilho característico, sua língua meio presa, sei lá, aquele canto meio esquisito, os movimentos elétricos… Algo havia naquele sujeito que o destacava de todos… Acho que dá pra resumir escrevendo: era de fato um poeta.
Por fim uma lembrança pessoal quando levamos o Luiz pra uma entrevista na nossa rádio, a Quarup FM, lá pelos idos de 96. Ele estava lançando o Raças Brasil, disco ótimo que ainda trazia como golpe de misericórdia A Luz do Vencedor, parceria dele com ninguém menos do que Candeia… Lembro de tentar disfarçar aquela filha da puta de lágrima furtiva nas primeiras audições…
É isso. Axé, Luiz Carlos da Vila. Que a sua Luz venha “ajudar a erguer o pilar de um mundo bem mais feliz”!

A Luz de um Vencedor (Luiz Carlos da Vila – Candeia)
Quem não lutar
Pra conquistar o que sonhou
Fazer por merecer
Se iluminar
Com a Luz que há no Vencedor
Pode até ganhar
E Mérito não ter

Aquecer
Os seus ideais em muito amor
Com o poder nas mãos não brincar
O arvoredo do mal derrubar
E arrancá-lo bem na raiz

Sua vida no bem sublimar
Pra ajudar a erguer o pilar
De um Mundo bem mais feliz

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