Valeu, João Ubaldo Ribeiro

Já me deparei em muitas ocasiões com várias sugestões de listas do tipo “livros pra entender o Brasil”, mas em nenhuma delas figurava Viva o Povo Brasileiro, obra incrível do João Ubaldo Ribeiro, falecido hoje.

Sem perder de vista importantes análises sociológicas, políticas, econômicas, antropológicas e tais, é difícil qualquer tentativa, veja bem, tentativa, de compreender esse país sem mergulhar também na fábula, no campo do imaginário, no universo mítico de um país que a gente aprende na escola que começou a partir de 1822 e olhe lá.

Viva o Povo Brasileiro é uma obra que representa isso, junto com O Romance d’A Pedra do Reino, do Ariano Suassuna. E talvez por ter essa opinião é que, para além dos trabalhos “sérios”, eu seja admirador do pajé Darcy Ribeiro, um cara que não teve medo de se expor a esse Brasil não-oficial, de viver essa aproximação desmoralizante para pretensas carreiras acadêmicas.

Aliás, tenho uma trova que ilustra esse sentimento:

coitado de quem prega
um academicismo senil
que nunca foi num brega
e quer explicar o Brasil

 

–—-

Ainda sobre João Ubaldo, lembro de duas experiências curiosas com livros dele. Uma é lendo uma coletânea de contos, Já Podeis da Pátria Filhos, que comprei em um sebo e que fui lendo no caminho para casa dentro de um ônibus, num baita engarrafamento. Ninguém entendia como um cara podia rir tanto lendo um livro em meio a uma situação daquelas de caos urbano. Mas a maestria em contar histórias tinha esse poder de arrancar risadas cúmplices onde quer que estivesse, como se você passasse a ser conhecido de figuras como Luis Cuiúba, aquele que comeu seis ou sete veranistas na Ilha de Itaparica (“safadagem por motivo de mariscos”).

Outro caso foi quando emprestei pra uma conhecida o A Casa dos Budas Ditosos e acompanhei um efeito arrebatador em sua vida. Beirando os trinta anos, depois do livro, que leu duas vezes seguidas, ela abandonou o marido, saiu do emprego, passou a usar o cabelo de jeitos diferentes, passou a “dar sem culpa” (palavras suas) e foi morar em outro estado. Virou uma outra pessoa ou o livro a ajudou a trazê-la de volta ao rumo da vida?

Que João Ubaldo Ribeiro descance em paz e abençoe mesmo de longe a Literatura e seus mágicos poderes.

Deixar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.